20 de agosto de 2015

Na luta contra a redução

Para entender:
Com 320 votos a favor e 152 contra, a Câmara dos Deputados aprovou, em segundo turno, na noite desta quarta-feira, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/93, que diminui a maioridade penal de 18 para 16 anos nos casos de crimes hediondos – como estupro e latrocínio – e também para homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. Projeto segue, agora, para o Senado.
O texto já havia sido aprovado em primeiro turno no início de julho, na forma de uma emenda apresentada pelos deputados Rogério Rosso (PSD-DF) e Andre Moura (PSC-SE). Esse texto alterou pontos do texto para que ele pudesse ser novamente votado, permitindo a aprovação. Entre as mudanças, o tráfico de drogas e o roubo qualificado foram excluídos do rol de crimes que levaria o adolescente a responder como um adulto.
Pela emenda aprovada, os jovens de 16 e 17 anos deverão cumprir a pena em estabelecimento separado dos adolescentes que cumprem medidas socioeducativas e dos maiores de 18 anos.
Em nota divulgada nesta noite pelo Ministério da Justiça, o ministro José Eduardo Cardozo reiterou sua posição contrária à PEC e destacou que a medida não vai diminuir a criminalidade. "A redução da maioridade penal é para nós algo insustentável. Caso isso seja aprovado nós teremos um erro jurídico, um erro do ponto de vista dos estudos científicos e um colapso no sistema prisional. Estaremos gerando mais violência e ferindo a nossa Constituição. Não podemos ser favoráveis a uma medida que trará enorme dano à segurança pública de todos os brasileiros", afirma o ministro.
O governo alega que a medida impacta negativamente as contas da União, podendo gerar um gasto anual de R$ 2,3 bilhões porque será necessário ampliar as unidades prisionais para manter aproximadamente 40 mil adolescentes presos por ano.
Fonte: diariocatarinense.clicrbs.com.br
LEIA - COLUNA NOSSA VOZ -  http://www.pj.org.br - 27/03/2015

[Nossa voz] Redução da Maioridade penal: O que Jesus faria?

Por Maria Clara Leal[*]
Em meio às conversas sobre a redução da maioridade penal, como cristã, gosto de tentar viajar no tempo e imaginar: qual seria o posicionamento de Jesus?
Em muitos momentos não nos permitimos atualizar. É comum nos prendermos nos exemplos dos evangelhos, utilizando-os como referências para tentar aplicar na nossa realidade formas de lidar com as situações apresentadas a nós. Claro que isso não é um problema! Como cristãos, devemos nos apoiar nas sábias palavras e exemplos que preenchem os textos de João, Lucas, Marcos e Mateus, bem como outros da Bíblia. Mas às vezes caímos no famoso “copiar” e “colar” da atualidade.
Se agirmos desta forma, é fácil nos descobrirmos desprevenidos, pois o reinventar humano nos assusta com novos acontecimentos. Hoje, não temos só cobradores de impostos, não temos só prostitutas, não temos só deficientes e leprosos. O mundo moderno nos apresenta constantemente uma variedade de novas situações. A velocidade dos acontecimentos nos obriga a pensar e nos posicionar agilmente. Não sei, mas parece que muitas vezes essas novas situações nos colocam em enrascadas. Por não termos situações idênticas na Bíblia, ficamos perdidos.
Jesus Cristo viveu em outra época, outros desafios e situações. Mas algo que considero fantástico na sua história são seus momentos de retiro. As reflexões do jovem de Nazaré também são contadas pelos evangelhos. Ele subia nos montes para rezar, sentava com calma junto com seus apóstolos e se retirava como fez durante os quarenta dias no deserto. Seus posicionamentos também eram frutos de suas reflexões. Por que então refletimos tão pouco? Estamos sendo devorados pelo mundo instantâneo que vivemos, precisamos copiar rapidamente a resposta, mas não nos damos o espaço para refletir.
Essas peculiaridades de Cristo passam despercebidas quando buscamos atentamente na leitura de sua história as respostas rápidas, um guia de instruções. Quando fazemos isso, anulamos nossa capacidade inventiva, nos tornamos cristãos presos à época de Jesus e incapazes de atuar no mundo de hoje da forma que ele fez no seu espaço.
Quando não achamos as respostas rápidas na bíblia, quando não encontramos situações idênticas às nossas, quando não sabemos encontrar nas entrelinhas e nos gestos do nazareno as respostas, nos sentimos no direito de deixar os acontecimentos à parte, julgamos melhor não pensar sobre isso. Ou então, nos sentimos autorizados a copiar qualquer outra fala de alguém que pareça convincente, acabando por reproduzir discursos de ódio e repletos de sentimento de vingança e senso comum.
Nesses momentos, passamos a ocupar o lugar daqueles que pegavam as pedras para prontamente atacá-las em Maria Madalena. Mas, como cristãos, não deveríamos ocupar o lugar de Jesus Cristo? Daquele que olha para as lágrimas de quem sofre? Quando me vejo no primeiro lugar, me exijo o retiro, o encarando como um ensinamento do filho de Deus. Não para fugir da situação, mas para acalmar os sentimentos hostis que às vezes nos envolvem.
Mas e a redução da maioridade penal?
Eu não me lembro de ter algum dia me deparado com alguém que soubesse a resolução de Jesus para o problema, ou seja, na Bíblia não tem uma passagem que relata o que o jovem de
Nazaré fez ao encontrar um menor infrator. Este não era um ponto em questão nas terras pisadas por ele naquele tempo. Isso não permite que caiamos no erro de tomar como opinião o discurso corriqueiro, aquele dito pela mídia ou por alguma personalidade “bacana”.
Então, opino pela reflexão, e retorno ao início deste texto. Qual seria o posicionamento de Jesus?
Quando um crime praticado por um jovem acontece, um assalto ou a realização de qualquer ato danoso contra uma vítima, sentimos muito junto com ela e com razão. Essa identificação com a vítima muitas vezes nos leva ao discurso:
“Tem que reduzir a maioridade penal sim!”
“Bandido bom é bandido morto”
“Se tem idade para matar, tem para ir para a cadeia”.
Mas podemos sair do lugar de apedrejadores, vamos olhar a cena de longe. O lugar ocupado por Jesus Cristo está vazio, nele não deveriam estar os cristãos? Não para defender o erro de alguém, mas para reconhecer o humano apedrejado, as suas necessidades, o lugar que foi destinado e ocupado por ele e que pode ter o feito a acabar ali. Assim, podemos pensar nos movimentos anteriores, o que faz um jovem chegar naquele lugar. Será que a sociedade cuida do caminho percorrido por ele no seu desenvolvimento? Será que ele teve espaço para atingir o seu potencial? De repente, percebemos que a nossa sociedade parece tão injusta quanto a de Cristo e que sim, o evangelho nos ensina a lidar com essa situação.
Acho que era isso que o Jesus pensava quando se encontrava com os sujeitos que pareciam perdidos neles mesmos, “sem voz, sem vez, sem lugar”. As atitudes tomadas por ele nas situações de miséria humana sempre eram baseadas no respeito e amor. Quando Pilatos lavou as mãos na condenação de Cristo, ele o fez para todas essas propostas inovadoras e de compaixão defendidas pelo jovem de Nazaré. É mais fácil lavar as mãos e ignorar a ter que o ajudar nas transformações. Hoje, quando nos deparamos com a questão da redução da maioridade penal, temos dois caminhos: ser Pilatos ou Cireneu.
Quando refletimos como Jesus, podemos compreender o outro e experimentar sua visão diante da vida. Quando fazemos isso com cada jovem que tem seus direitos negados, que é pobre e marginalizado (pois é esse o perfil da maioria dos que cometem infrações no nosso país) compramos a causa cristã. Deixamos de ser Pilatos quando não lavamos as mãos e ajudamos o outro a carregar a sua cruz, como fez Cireneu. Hoje, nós somos convidados a defender o reino fraterno proposto por Jesus Cristo. Não reduzir a maioridade penal é abrir o espaço para novas propostas de lidar com o problema, é não se conformar com ele, assim como o filho de Deus não se conformou, bem como não naturalizou as práticas de sua época.
Quando fazemos isso, encontramos qual seria o posicionamento de Jesus e descobrimos que os evangelhos podem nos proporcionar mais do que imaginamos.
[*]Maria Clara Leal, 23 anos, é estudante de Psicologia e participa da Pastoral da Juventude da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, Conceição de Macabu/RJ. Também atua como voluntária na Pastoral da Criança e defensora dos direitos dos animais.

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